quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Quarta Feira de Cinzas





“Memento, homo, quia pulvis es, et in pulverem reverteris.”
 “Lembra-te, homem, que és pó e ao pó retornarás.”


Livro de Joel (II, 12-19).

É isto O que diz o Senhor: Voltai-vos para Mim, de todo o vosso coração, com jejuns, com lágrimas e com gemidos. Rasgai os vossos corações e não os vossos vestidos, e convertei-vos ao Senhor vosso Deus, porque Ele é benigno e compassivo, paciente e de muita misericórdia, e inclinado a suspender o castigo. Quem sabe se Ele quererá voltar-se para vós e perdoar-vos, e deixar após si alguma bênção, algum sacrifício e libação para o Senhor vosso Deus? Tocai a trombeta em Sião, ordenai um jejum sagrado, convocai uma assembleia, fazei vir todo o povo, adverti a todos que se purifiquem, juntai os velhos, reuni os pequeninos e os meninos de peito; que o esposo deixe o seu quarto, e a esposa a sua alcova. Chorem os sacerdotes, ministros do Senhor, postos entre o vestíbulo e o altar, e digam: Perdoai Senhor, perdoai ao vosso povo, e não deixeis que na ignomínia se avilte a vossa herança, de sorte que as nações a dominem; porque os povos diriam: Onde está o Deus deles? O Senhor vibrou com amor ardente pela sua terra, e perdoou ao seu povo. E o Senhor falou, dizendo ao seu povo: Eis que vou enviar-vos trigo, e vinho e azeite, e ficareis abastecidos destes gêneros; e não vos entregarei mais ao insulto das nações, diz o Senhor onipotente. ℟. Deo gratias!


Gradual (Salmo LVI. 2,4)

Tende piedade de mim, ó Deus, tende piedade de mim, porque a minha alma em vós procura o seu refúgio. Abrigo-me à sombra de vossas asas, até que a tormenta passe. Mande ele do céu auxílio que me salve, cubra de confusão meus perseguidores; envie-me Deus a sua graça e fidelidade.

Evangelho de Jesus Cristo segundo São Mateus (VI, 16-21).

Naquele tempo: Disse Jesus aos seus discípulos: “Quando jejuais, não queirais fazer-vos tristes, como os hipócritas; porque eles desfiguram os seus rostos, para mostrar aos homens que jejuam. Na verdade vos digo que (já) receberam a sua recompensa. Quanto a ti, porém, quando jejuas, perfuma a tua cabeça e lava o teu rosto, a fim de que não pareça aos homens que jejuas, mas sim a teu Pai, que está presente no mais recôndito: e teu Pai, que vê o mais recôndito, te dará a recompensa. Não queirais entesourar para vós tesouros na terra, onde a ferrugem e a traça os consomem, e onde os ladrões os desenterram e roubam; ao contrário, entesourai para vós tesouros no Céu, onde nem a ferrugem, nem a traça os consomem, e onde os ladrões os não desenterram nem roubam. Porque onde está o teu tesouro, ai está o teu coração”. ℟. Laus tibe, Christe!

Traduções das leituras extraídas do Missal Quotidiano por Pe. Gaspar Lefebvre OSB (beneditino da Abadia de Santo André) – Bruges, Bélgica: Biblica, 1963 (com adaptações).



“Com o suor do teu rosto comerás o pão, enquanto não voltares à terra, porque dela foste tirado: tu és pó e pó te tornarás!” (Gn 3, 19).

(…) O apelo à conversão, de fato, ressalta e denuncia a fácil superficialidade que caracteriza com muita frequência a nossa vida. Converter-se significa mudar de direção no caminho da vida: não com um pequeno ajustamento, mas com uma verdadeira inversão de marcha. Conversão é ir contra a corrente, onde a “corrente” é o estilo de vida superficial, incoerente e ilusório, que muitas vezes nos arrasta, nos domina e nos torna escravos do mal ou prisioneiros da mediocridade moral. Com a conversão, ao contrário, tem-se como objetivo a medida alta da vida cristã, confiamo-nos no Evangelho vivente e pessoal, que é Cristo Jesus. A sua pessoa é a meta final e o sentido profundo da conversão, ele é o caminho pelo qual todos são chamados a caminhar na vida, deixando-se iluminar pela sua luz e amparar pela sua força que move os nossos passos. Deste modo a conversão manifesta o seu rosto mais maravilhoso e fascinante: não é uma simples decisão moral, que retifica o nosso modo de vida, mas é uma escolha de fé, que nos envolve totalmente na comunhão íntima com a pessoa viva e concreta de Jesus. (…) A conversão é o “sim” total de quem entrega a própria existência ao Evangelho, respondendo livremente a Cristo que foi o primeiro a oferecer-se ao homem como caminho, verdade e vida, como o único que liberta e salva. (…)
O momento favorável e de graça da Quaresma mostra-nos o próprio significado espiritual também através da antiga fórmula: Recorda-te que és pó e pó te tornarás,que o sacerdote pronuncia quando impõe sobre a nossa cabeça um pouco de cinza. Somos assim remetidos para o início da história humana, quando o Senhor disse a Adão depois do pecado original: “Com o suor do teu rosto comerás o pão, enquanto não voltares à terra, porque dela foste tirado: tu és pó e pó te tornarás!” (Gn 3, 19). Aqui, a palavra de Deus recorda-nos a nossa fragilidade, aliás a nossa morte, que é a sua forma extrema. Perante o inato medo do fim, e ainda mais no contexto de uma cultura que de muitos modos tende a censurar a realidade e a experiência humana do morrer, a liturgia quaresmal, por um lado, recorda-nos a morte convidando-nos ao realismo e à sabedoria, mas, por outro, estimula-nos sobretudo a aceitar e a viver a novidade inesperada que a fé cristã desencadeia na realidade da própria morte.

O homem é pó e pó se tornará, mas é pó precioso aos olhos de Deus, porque Deus criou o homem destinando-o à imortalidade. Assim a fórmula litúrgica “Recorda-te que és pó e pó te tornarás” encontra a plenitude do seu significado em referência ao novo Adão, Cristo. Também o Senhor Jesus quis partilhar livremente com cada homem o destino da fragilidade, sobretudo através da sua morte na cruz; mas precisamente esta morte, cheia do seu amor pelo Pai e pela humanidade, foi o caminho para a ressurreição gloriosa, através da qual Cristo se tornou fonte de uma graça doada a quantos creem n’Ele e são tornados partícipes da própria vida divina. Esta vida que não terá fim já está a decorrer na fase terrena da nossa existência, mas será levada a cumprimento depois “da ressurreição da carne”. O pequeno gesto da imposição das cinzas revela-nos a singular riqueza do seu significado: é um convite a percorrer o tempo quaresmal como uma imersão mais consciente e intensa no mistério pascal de Cristo, na sua morte e ressurreição, mediante a participação na Eucaristia e na vida de caridade, que da Eucaristia nasce e na qual encontra o seu cumprimento. Com a imposição das cinzas nós renovamos o nosso compromisso a seguir Jesus, a deixar-nos transformar pelo seu mistério pascal, para vencer o mal e praticar o bem, para fazer morrer o nosso “homem velho” ligado ao pecado e fazer nascer o “homem novo” transformado pela graça de Deus. (…)

Papa Bento XVI
Audiência Geral de 17/02/2010 – Trechos (texto integral disponível no site doVaticano)

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