sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

“Pelo fruto conhecereis a árvore”

Domingo Gaudete




É notável que os domingos do Advento têm uma grande unidade litúrgica graças a um objetivo final comum: o Natal. A sequência dos Evangelhos escolhidos para cada um dos quatros domingos, entretanto, é, à primeira vista, espantosa. Os temas são respectivamente: o fim dos tempos, a vida pública de Jesus, a pregação do Precursor e o início dessa mesma pregação. Trata-se de fato de um retorno no tempo gradativo. Cabe a nós explicar o porquê.

O objetivo final do Advento como dissemos é preparar o Natal, e isso se faz procurando dar a conhecer melhor a essência mesma dessa festa, expressa no Evangelho da Missa do Dia: “O Verbo de Deus se fez carne”. Ora, qual é a melhor maneira de dar a conhecer isso? É o próprio Verbo de Deus que nos ensina: “Pelo fruto conhecereis a árvore”. É conhecendo os frutos da Encarnação, então, que nós conheceremos melhor esse mistério. E porque os frutos soem ser posteriores à própria árvore, a Igreja começa pelo derradeiro e vêm voltando no tempo, conforme o Advento vai avançando, até chegar à Árvore: Cristo. “Eu sou a videira, vós as varas. O que permanece em Mim e Eu nele, esse dá muito fruto. ”

Vêm hoje, no Evangelho que acabamos de ouvir, os fariseus perguntar a João Batista o que ele é: “Quem és tu? ” Ele responde: “Eu sou a voz que clama”. Note-se que ele não responde quem ele é: filho de Zacarias e de Isabel, João, o maior entre os nascidos de mulher. Ele responde o que ele faz: “Eu sou a vós que clama”. Os fariseus vieram procurando a árvore: “Quem és pois? És tu Elias? És tu o profeta?”, mas o Precursor lhes mostra o fruto, porque pelo fruto é que deviam conhecer a Árvore.

Se alguma dúvida ainda existe sobre esse forma de conhecer as coisas, veja-se o Evangelho do Segundo Domingo: “És tu aquele que há de vir?...Ide e contai a João o que ouvistes e vistes: Os cegos veem, os coxos andam, os leprosos são limpos, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam, os pobres são evangelizados.” E ainda o do Primeiro Domingo: “Vede a figueira e todas as árvores. Quando começam a desabrochar, conheceis que está perto o estio. Assim, também, quando virdes que acontecem estas coisas, sabei que está próximo o reino de Deus.”

Se o problema da ordem dos Evangelhos escolhida para o Advento parece assim estar resolvido, outros tantos, que certamente são de muito maior interesse vosso, no dia de hoje, parecem estar em aberto. Qual o motivo para ser hoje o Domingo Gaudete? Qual é a relação do Evangelho com o resto da Missa e com o gaudio do Gaudete? E, talvez, realmente a questão de interesse de todos: porque o padre está vestido de rosa?

Nada é ao acaso na nossa liturgia ou, se algo era, a esse acaso já foi dado um motivo. O rosa é a mistura do violeta com o branco. É a alegria em um tempo de penitência, é a marca dos Domingos Gaudete e Laetare, na Quaresma e na Pascoa respectivamente.

A partir daqui, um elemento vai ajudar-nos a entender os outros. A porta é o Evangelho, a chave é a Epístola e o prêmio é Cristo que diz: “Eis que estou à porta e bato. Se alguém ouvir a minha voz e me abrir a porta, entrarei em sua casa, cearei com ele, e ele comigo.”

A porta é “pelos frutos conhecereis a Árvore”. Qual será a chave que nos permitirá abri-la e ter Cristo conosco senão os frutos dignos do mesmo Cristo? Eis o assunto da Epístola de São Paulo aos Filipenses: os frutos que produzem um verdadeiro cristão.

O primeiro fruto é a alegria: “Alegrai-vos, mais uma vez o digo, alegrai-vos”. Aquele que é verdadeiro católico, por mais que sofra, sempre tem um motivo de alegria incomensurável: “O Senhor está próximo”. Próximo porque se aproxima o Natal, a comemoração da vinda de Nosso Senhor entre nós para nos salvar. Próximo porque, pela graça, Ele se digna vir habitar em nossas almas. Próximo enfim, porque Ele há de vir a julgar os vivos e os mortos e fazer justiça de todo bem e de todo mal cometido nesse vale de lágrimas. Esse fruto é tão necessário para aquele que quer ter a Árvore que São Francisco de Sales disse a respeito: “Um santo triste é um triste santo.” E nós procuraremos em vão a vida de um santo onde a alegria da vida não desse a conhecer a conformidade com Nosso Senhor Jesus Cristo.

O segundo fruto é a modéstia: “Que a vossa modéstia seja conhecida de todos os homens.” A modéstia aqui, não se restringe à acepção mais comum desse termo, que é a ordem no vestir-se. Trata-se aqui de um modo de viver verdadeiramente cristão, que se exprima em tudo aquilo que fazemos. Todos os frutos que produzimos só podem vir do cristão que somos. Não há negociação possível. “Não pode a árvore boa dar maus frutos” e se nós queremos - somente em alguns casos - dar maus frutos, porque como Eva vimos que eles são às vezes apetitosos, nós deixamos a serpente subir em nossa árvore e nos tornamos filhos do príncipe desse mundo.

Que não seja assim entre nós, caríssimos fiéis: “que a vossa luz brilhe diante dos homens para que vejam as suas obras boas e glorifiquem a Deus”. Que nós não nos impeçamos de abrir a porta por querer ter na nossa árvore um daqueles tantos frutos que o demônio nos propõe hoje e que nos parecem tão apetitosos. Antes que a nossa renúncia a essas coisas sirva de exemplo e de semente para que aqueles que nos veem produzam também frutos, à proporção de cem por um.

Por fim e talvez o mais necessário dos frutos, sem o qual os outros dois não podem subsistir: a oração. “Em todas as circunstâncias manifestai a Deus as vossas necessidades por meio de orações e súplicas, unidas à ação de graças.” O bom católico sabe sempre reconhecer que os frutos da vara são os frutos da vinha e, assim reconhecendo nossa dependência total para com Nosso Senhor, só nos resta estar sempre em ação de graças por tantos benefícios recebidos. Se Santo Afonso não considerasse de suma importância em nossas vidas a presença desse fruto que é a oração, ele não teria dito: “Quem reza se salva, quem não reza se condena.”

No Evangelho de hoje, os fariseus perguntam a São João: “Quem és tu?”, na esperança de encontrar a Árvore que eles aguardavam com tanta ansiedade, Cristo. Por isso ele responde diretamente: ”Eu não sou o Cristo”. Nós sabemos, por fontes exteriores ao Evangelho, que nessa mesma época muitos falsos cristos tiveram numerosos seguidores, tamanha era a expectativa dos judeus.

Porque esses mesmos que perguntam com ansiedade hoje a João sobre o Cristo, não o ouvem quando ele diz: “Eis o Cordeiro de Deus, eis o que tira o pecado do mundo”? Porque eles queriam a árvore que produzisse frutos à maneira deles e não conhecer a Árvore pelos frutos que ela produzia. Por isso Ele “estava no mundo e o mundo não o reconheceu”.

Caros católicos, não há católico de nascimento ou católico não praticante, assim como não há árvore boa sem bons frutos: “Vós sereis meus amigos se fizerdes o que vos mando” nos diz Nosso Senhor.

Se queremos, nesse Natal que se aproxima, abrir a porta para melhor conhecer o Menino Deus que bate nela, busquemos o reino de Deus e sua Justiça e todo o mais nos será dado por acréscimo.

Pe José Luiz Zucchi I.B.P

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