terça-feira, 18 de agosto de 2015

Entrevista de Dom Athanasius Schneider ao Catholic Voice

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Fonte: Catholic Voice - Nesta nova entrevista, Dom Athanasius Schneider comenta o Instrumentum Laboris do Sínodo de 2015, alerta contra a tentativa de buscar uma linguagem politicamente correta e explica o dever dos bispos católicos quando confrontados com os temas morais contemporâneos. Sua Excelência também oferece exemplos de santos e escritos espirituais em que podemos buscar consolação e encorajamento neste tempo de confusão e desorientação na Igreja.


Catholic Voice - Sua Excelência, o Instrumentum Laboris do Sínodo de 2015 sustenta que há um "comum acordo" em favor do "caminho penitencial" para os divorciados e recasados "sob a autoridade do Bispo, para os fiéis divorciados e recasados civilmente, que se acharem numa situação irreversível de coabitação". É correto dizer que existe um "comum acordo"?

Dom Athanasius Schneider - A afirmação de que há um "comum acordo" sobre o "caminho penitencial" não é correta. O único docimento público que permitiria determinar a efetiva opinião dos bispos sobre este tópico é a "Relatio Synodi" de 2014. Lá está documentado que 40% dos bispos do Sínodo rejeitaram tal "caminho penitencial". Quando confrontados com tal resultado, dificilmente se pode falar sobre um "comum acordo". Além do mais, não há nenhuma especificação de uma concreta definição sobre tal "caminho penitencial".


Catholic Voice - À luz da frase "há um comum acordo", está prejudicada a credibilidade do Instrumentum Laboris? Pode-se mesmo concluir que há uma tentativa de impor a comunhão aos divorciados e recasados no Sínodo, apesar da oposição. Você tem algo a falar sobre isso?

Dom Athanasius Schneider - À luz de uma cuidadosa análise dos fatos, resta a suspeita de que os autores do Instrumentum Laboris tentam fazer avançar a agenda de um certo grupo de pressão que quer modificar a Lei Divina da não admissão de divorciados e recasados à Comunhão.

Catholic Voice - Ao falar sobre o Sínodo, Dom [Bruno] Forte disse que as prioridades devem ser a discussão da permissão para que aqueles que se divorciaram e voltaram a casar fora da Igreja possam ser "padrinhos ou madrinhas, catequistas, ministros extraordinários da Eucaristia". O que você pensa sobre isso?

Dom Athanasius Schneider - Primeiramente, é necessário lembrar o significado dos padrinhos de acordo com o ensinamento e prática perene da Igreja: o padrinho deve ajudar o batizado a levar uma vida cristã de acordo com o batismo e a cumprir fielmente todas as obrigações a ele inerentes. Para ser padrinho, a pessoa deve ser um católico que leva uma vida de fé de acordo com a função que irá exercer (Cânon 872 e 874, §§1º-3º). Padrinhos e responsáveis são obrigados a educar as crianças pela palavra e pelo exemplo de fé e de prática da vida cristã (Cânon 774, §2º). Quando um padrinho, uma madrinha ou m catequista leva uma vida que publicamente contradiz o Sexto Mandamento e a indissolubilidade do casamento cristão, então ele ou ela obviamente não pode ser uma exemplo de vida de fé. O mesmo é válido para os ministros extraordinários da Eucaristia. A defesa da admissão de divorciados e recasados na função de padrinhos e catequistas não é, em última análise, para o verdadeiro bem espiritual das crianças, mas para a instrumentalização de uma agenda ideológica específica. Isso é uma desonestidade e um escárnio para com a instituição dos padrinhos e catequistas que, por meio de uma promessa pública, assumiram a tarefa de educadores da fé. No caso dos padrinhos ou catequistas que são divorciados ou recasados, a sua vida, no entanto, contradiz permanentemente as suas palabras, e então eles têm de enfrentar a admoestação feita pelo Espírito Santo através da boca do Apóstolo S. Tiago: "Sede cumpridores da palavra e não apenas ouvintes; isto equivaleria a vos enganardes a vós mesmos" (Ti 1, 22)



Catholic Voice - Excelência, no andamento do debate sobre o "casamento" homossexual, alguns grupos católicos se abriram para a noção de reconhecimento de que casais homossexuais podem ter uma relação duradoura, assim eles concluíram que é possível reconhecer a união civil entre homossexuais. Está evidente que alguns bispos apóiam esta idéia, mas ela pode se tornar uma posição católica autêntica?

Dom Athanasius Schneider - Esta não poderá nunca ser uma posição autenticamente católica, pois contradiz diretamente as palavras de Deus, que diz que os atos homossexuais e o modo de vida homossexual são uma grave ofensa à vontade de Deus (Gn 18,20; Lv 18,22; 20,13; Is 3,9; Rm 1,26-27; 1Co 6,10; 1Tm 1,10; Jd 7). Cometer o mal por bastante tempo e até mesmo um relacionamento amoroso não podem transformar o mal em bem. Apenas o verdadeiro arrependimento, que inclui a contrição e a firme intenção de evitá-lo, afasta, com a Graça de Deus, o mal. Seria absurdo afirmar que o alcoolismo ganharia um reconhecimento positivo porque é duradouro e porque o relacionamento amoroso entre duas pessoas se fundou no seu gosto pelo álcool.   

Catholic Voice - Há também o que parece ser um impulso por uma "nova linguagem" com alguns dizendo que o uso de frases como "tendências homossexuais" e "intrinsecamente desordenados" deveriam ser evitadas, sendo menos ofensivos -  o que você interpreta este movimento pelo uso de uma linguagem politicamente correta?

Dom Athanasius Schneider - Temos de chamar as coisas pelo que elas são. Caso contrário, enganaremos os outros e a nós mesmos.Chamar as coisas pelo que elas são não significa uma intenção de fomentar a discriminação, desde que falemos com respeito e sabedoria. Há alguns sintomas de deficiência de natureza corporal e espiritual, tais como medo de altura, claustrofobia, enjôo, miopia etc. Nenhuma pessoa de bom senso vai se indignar quando denominamos esses fenômenos de deficiência. Na verdade, a atração homossexual é, intrinsecamente, um sintoma de deficiência psico-sexual, a qual todas as civilizações da história consideraram uma deficiência e a chamaram pelo seu nome. Sob pressão da nova ideologia de gênero, que tem raízes na ideologia marxista, na década de 1970 a homossexualidade foi excluída do Manual Internacional de Doenças Psicológicas. Nesse caso, pessoas que possuem tendências homossexuais  se tornaram reféns de uma ideologia radical, na medida em que lhes é negada a oportunidade de receber a cura ou melhoria da sua situação psicológica. Ter uma deficiência não é uma vergonha, mas um fato. Aqueles que efetivamente encorajam pessoas deficientes, no nosso caso, pessoas com tendências homossexuais, a abusar da sua deficiência  tornando-se mais deficientes e consequentemente viciados, cometem uma injustiça grave contra essas pessoas que precisam e querem receber ajuda em sua deficiência espiritual e psicológica.


Catholic Voice - Excelência, desde a legalização do aborto na Irlanda, em 2013, hospitais católicos, como o Mater Misericordiae University Hospital, Dublin, têm emitido declarações indicando que irão cumprir as novas leis sobre o aborto. Nessas circunstâncias, qual é o dever do arcebispo ou bispo que tem jurisdição sobre esses hospitais?


Dom Athanasius Schneider - O dever de um bispo católico em tal caso é privar o hospital do título "Católico" e lembrar aos seus fiéis que ser cúmplice do crime terrível do aborto é cometer um pecado grave e ameaçar com excomunhões. A punição de excomunhão é uma medida terapêutica que visa evitar que a pessoa culpada cometa mais crimes e então assim garantir a sua salvação eterna. Este foi o próprio método usado por Deus mesmo (a pregação de julgamento e punição através dos Profetas), de Nosso Senhor Jesus Cristo (o discurso da excomunhão em Mt 18, 15-18) e dos Apóstolos (a excomunhão realizada por São Paulo, 1Co 5, 4-5) e então este tem sido o método da Igreja. Quando a Igreja abandona este método divino, é infiel a Deus, deixando de ser uma verdadeira mãe que pune seus filhos com vistas à sua salvação. Ao contrário, tal Igreja será uma falsa mãe que desastrosamente mima os filhos ou uma madrasta que é indiferente à salvação deles. As seguintes palavras de excomunhão pronunciadas por São Paulo e inspiradas pelo Espírito Santo, permanecem válidas para todos os momento das história da Igreja, inclusive para os nossos dias: "Em nome do Senhor Jesus -, reunidos vós e o meu espírito, com o poder de nosso Senhor Jesus -, seja esse homem entregue a Satanás, para mortificação do seu corpo, a fim de que a sua alma seja salva no dia do Senhor Jesus" (1Co 5,4-5)..

Catholic Voice - Durante o debate sobre o "casamento" homossexual na Irlanda, um bispo declarou que católicos poderia em consciência votar a favor da proposta e admoestou-os a não votar contra por ódio. Ademais, muitos sacerdotes usaram a mídia também para encorajar eleitores a redefinir o conceito de casamento. Essa situação é repetida através do mundo ocidental - o que você pensa que aconteceu com os sacerdores a esse respeito e o que deveria ser feito para corrigir essas questões?

Dom Athanasius Schneider - Esses sacerdotes que encorajaram os fiéis a votar em prol do "casamento" homossexual revelaram eles mesmos serem falsos profetas, como aqueles que perverteram a Palavra de Deus. Eles mostraram a si mesmos como mentirosos públicos, a quem são perfeitamente aplicáveis aquelas palavras da Sagrada Escritura: "Ai daqueles que ao mal chamam bem, e ao bem, mal, que mudam as trevas em luz e a luz em trevas, que tornam doce o que é amargo, e amargo o que é doce!" (Is 5,20) e: "Os teus profetas tinham visões apenas extravagantes e balofas. Não manifestaram tua malícia, o que teria poupado teu exílio. Os oráculos que te davam eram apenas mentiras e enganos" (Lm 2,14). Para aqueles padres e bispos, o Apóstolo Paulo, sem dúvida, diria hoje essas palavras: "Esses tais são falsos apóstolos, operários desonestos, que se disfarçam em apóstolos de Cristo" (2Co 11,13). Com vistas a remediar essa situação, primeiramente é necessário que os bispos fiéis ensinem claramente e sem ambiguidade a verdade de Cristo e corrijam explicitamente o ensino desses falsos profetas. 

Catholic Voice - Excelência, em uma de suas entrevistas, o Sr. mencionou a tentativa de manipulação dos procedimentos do Sínodo de 2014. Muitos fiéis ao redor do mundo estão inquietos porque está havendo tentativas de manipular o Sínodo de 2015. O que pode ser feito para barrar essa manipulação? O que aqueles que não estão diretamente envolvidos no Sínodo podem fazer se surgirem indícios de novas manipulações?

Dom Athanasius Schneider - A fim de parar essas manipulações, nós devemos, em primeiro lugar, implorar ardentemente pela intervenção divina, de modo que as seguintes palavras de Deus possam se realizar em nossos dias durante o próximo Sínodo: "frustra os projetos dos maus, cujas mãos não podem executar os planos; apanha os jeitosos em suas próprias manhas, e os projetos dos astutos se tornam prematuros" (Jo 5,12-13).
Além do mais, nós temos que expor e defender a verdade divina sobre o casamento e a família, escrevendo e falando, exercendo, por este meio, a serviço da verdade, um importante gesto de amor por nossos irmãos. Quando há certos indícios, deve-se tentar desmascarar as artimanhas dos falsos profetas dentro da Igreja. São Pedro, o primeiro Papa, escreveu em sua segunda Carta Encíclica as seguintes palavras, que são aplicáveis àqueles padres e bispos que ensinam em nossos dias a bondade do estilo de vida homossexual e a legitimidade do recebimento da Sagrada Comunhão por aqueles que vivem publicamente num relacionamento adulterino: "Assim como houve entre o povo falsos profetas, assim também haverá entre vós falsos doutores que introduzirão disfarçadamente seitas perniciosas. Eles, renegando assim o Senhor que os resgatou, atrairão sobre si uma ruína repentina.Muitos os seguirão nas suas desordens e serão deste modo a causa de o caminho da verdade ser caluniado.Movidos por cobiça, eles vos hão de explorar por palavras cheias de astúcia. Há muito tempo a condenação os ameaça, e a sua ruína não dorme" (2 Pe 2,1-3).

Catholic Voice - Sua Excelência, neste tempo de confusão e desorientação sem precedentes, há na Igreja algum santo ou texto espiritual para o qual devamos nos voltar em busca de consolação e encorajamento? O Sr. poderia dividir com os nossos leitores algumas palavras de incentivo?

Dom Athanasius Schneider - Nós temos que olhar para aqueles santos que brilharam em períodos particularmente difícies na história da Igreja. Entre os sacerdotes, eu indicaria Santo Atanásio, seus sofrimentos e seus escritos sobre a história dos arianos; São Gregório VII, que defendeu intrepidamente a castidade (contra o concubinato clerical e a sodomia) e a liberdade (contra a interferência do poder civil nos assuntos espirituais) da Igreja, a Esposa de Cristo; São João Fisher, que, à custo de sua vida, foi o único bispo inglês de seu tempo que defendeu a indissolubilidade do matrimônio e a primazia do Papa; São Pio X, que foi extremamente claro em suas palavras e seus desígnios, e corajoso, nunca se curvando à pressão do politicamente correto, nem dentro, nem fora da Igreja.
Entre os leigos, pode-se mencionar particularmente: Santa Catarina de Sena; São Thomas More; Gabriel García Moerno, o piedoso e corajoso presidente do Equador, que foi assassinado em 1875, por "odium fidei", ao sair da igreja, após permanecer uma hora em adoração eucarística. O Servo de Deus Jerome Lejeune (+1994): ele foi relegado ao ostracismo pela elite médica, acadêmica e política, por causa de sua forte oposição ao aborto; ele não recebeu um aumento de salário sequer por aproximadamente vinte anos; suas bolsas de pesquisas foram retiradas e ele foi forçado a fechar seu laboratório.
Seria uma grande ajuda espiritual para nós, em meio à perseguição de fora da Igreja e da marginalização de dentro da Igreja, ler as biografias e escritos dos santos e servos de Deus acima mencionados e, especialmente, a vida dos mártires. Eu li em algum lugar esta frase, o que pode incentivar-nos: "Não é importante o que as pessoas dizem sobre nós hoje, mas o que eles vão dizer sobre nós cem anos depois de nossa morte".

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