domingo, 24 de janeiro de 2016

Domingo da Septuagésima

Ide vós também para a minha vinha

O CICLO DA PÁSCOA

Celebração do Mistério da Redenção da humanidade

           Está encerrada a primeira parte do Ano eclesiástico, o Ciclo do Natal, em que se relembra o Mistério da Encarnação do Verbo Divino. O Salvador  veio ao mundo, e alegres, nós O saudamos como Rei e Lhe rendemos a nossa homenagem. 
           Sua missão é remir a humanidade. Eis o sentido da segunda parte do Ano eclesiástico: a celebração do Mistério da Redenção. Assim como no Natal teve a sua preparação: o Advento, a sua celebração: Natal até Epifania, e o seu prolongamento: o Tempo depois da Epifania, igualmente a Páscoa tem a sua preparação: a Septuagésima, a Quaresma e o Tempo da Paixão, a sua celebração: a Páscoa até Pentecostes, e o seu prolongamento: o Tempo depois de Pentecostes. 

I. O TEMPO DA SETUAGÉSIMA

1. Significação deste Tempo. A Setuagésima é a primeira parte da preparação para a Páscoa e abrange as três semanas anteriores à Quaresma. Embora não fossem exatamente 70, 60 e 50 dias antes da festa da Ressurreição, em imitação, talvez, ao domingo seguinte, Quadragésima, foram estes domingos denominados: Setuagésima, Sexagésima e Quinquagésima.

A mobilidade da festa da Páscoa faz também variar a data da Setuagésima, que, todavia, ordinariamente se abeira do dia 2 de fevereiro, conclusão do Tempo de Natal.

O Domingo da Setuagésima e os dois seguintes são, pois, uma preparação para a Quaresma, tempo de penitência propriamente dito.

2. Nossos sentimentos durante este Tempo. Devem conformar-se com o espírito do Tempo, que é expresso pelos textos das Missas e do Ofício divino que os Sacerdotes rezam. A lembrança da criação do mundo, da queda no pecado e de todas as suas consequências como sejam: a luta do bem contra o mal, da luz contra as trevas, a dor, o sofrimento, eis os assuntos que devem ocupar nosso pensamento durante estas semanas. Começou a luta contra o pecado, contra o mundo e contra a carne. Pelo combate, para a vitória. Pela cruz, para a luz. Pela morte, para a vida. Pelo sepulcro, para a Ressurreição com o Cristo!

Jesus Cristo mesmo nos ensina nos Evangelhos destes domingos estas verdades, e S. Paulo, lutador corajoso, anima-nos por seu exemplo e por sua palavra. Animam-nos ainda os Santos em cujas igrejas nos reunimos.

3. Particularidades deste Tempo. Os Sacerdotes usam paramentos roxos em sinal de penitência. O Gloria in excelsis, que se entoava alegremente desde o Natal, não mais é ouvido, exceto nas festas dos Santos. Igualmente desaparece o Aleluia do Ofício e das Missas ate o Sábado Santo. Nota-se ainda que depois do Gradual, em vez., do Aleluia e seu Versículo, reza-se o Trato, salmo de penitência.

Missal Quotidiano, D. Beda Keckeisen, O.S.B., Tipografia Beneditina, Bahia, junho de 1957.


Epístola: São Paulo Apóstolo aos Coríntios (ICor. IX , 24-27; 10, 1-5).

Irmãos: Nas corridas de um estádio, todos correm, mas bem sabeis que um só recebe o prêmio. Correi, pois, de tal maneira que o consigais. Todos os atletas se impõem a si muitas privações; e o fazem para alcançar uma coroa corruptível. Nós o fazemos por uma coroa incorruptível.  Assim, eu corro, mas não sem rumo certo. Dou golpes, mas não no ar. Ao contrário, castigo o meu corpo e o mantenho em servidão, de medo de vir eu mesmo a ser excluído depois de eu ter pregado aos outros. (Não quero que ignoreis, irmãos), que os nossos pais estiveram todos debaixo da nuvem e que todos atravessaram o mar; todos foram batizados em Moisés, na nuvem e no mar; todos comeram do mesmo alimento espiritual; todos beberam da mesma bebida espiritual (pois todos bebiam da pedra espiritual que os seguia; e essa pedra era Cristo). Não obstante, a maioria deles desgostou a Deus, pois seus cadáveres cobriram o deserto. Deo gratias!


Santo Evangelho: Continuação do Santo Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Mateus (S. Mateus, XX, 1-16).

Naquele tempo, disse Jesus, aos seus discípulos, esta parábola: o Reino dos céus é semelhante a um pai de família que saiu ao romper da manhã, a fim de contratar operários para sua vinha. Ajustou com eles um denário por dia e enviou-os para sua vinha. Cerca da terceira hora, saiu ainda e viu alguns que estavam na praça sem fazer nada. Disse-lhes ele: - Ide também vós para minha vinha e vos darei o justo salário. Eles foram. À sexta hora saiu de novo e igualmente pela nona hora, e fez o mesmo. Finalmente, pela undécima hora, encontrou ainda outros na praça e perguntou-lhes: - Por que estais todo o dia sem fazer nada? Eles responderam: - É porque ninguém nos contratou. Disse-lhes ele, então: - Ide vós também para minha vinha. Ao cair da tarde, o senhor da vinha disse a seu feitor: - Chama os operários e paga-lhes, começando pelos últimos até os primeiros. Vieram aqueles da undécima hora e receberam cada qual um denário. Chegando por sua vez os primeiros, julgavam que haviam de receber mais. Mas só receberam cada qual um denário. Ao receberem, murmuravam contra o pai de família, dizendo: - Os últimos só trabalharam uma hora... e deste-lhes tanto como a nós, que suportamos o peso do dia e do calor. O senhor, porém, observou a um deles: - Meu amigo, não te faço injustiça. Não contrataste comigo um denário? Toma o que é teu e vai-te. Eu quero dar a este último tanto quanto a ti. Ou não me é permitido fazer dos meus bens o que me apraz? Porventura vês com maus olhos que eu seja bom? Assim, pois, os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos. [ Muitos serão os chamados, mas poucos os escolhidos.] Laus tibi, Christe!


Lefebvre, Dom Gaspar. Missal Quotidiano e Vesperal. Bruges, Bélgica; Abadia de S. André, 1960

Sermão da Septuagésima

"O Reino dos Céus é semelhante a um homem pai de família".

(S. Mateus 20, 1)

Em nome do Pai e do Filho + e do Espírito Santo. Amém.

Ave Maria...

Uma vez que muitos bispos e padres têm atacado as verdades católicas sobre a família e os sacramentos, sobretudo do santo sacramento do matrimônio, e ainda defendendo o erro sob a aparência de misericórdia, nos pareceu útil e necessário ir tratando nos sermões sobre questões ligadas aos deveres dos esposos e pais, e dos filhos, porque se há uma causa importantíssima da condenação de muitas almas hoje, esta causa é a falta da pregação das verdades divinas. Como diz Isaías, "se a palavra de Deus faltasse, as nossas almas seriam estéreis, esquálidas e sem frutos, como Sodoma e Gomorra" (I, 9). E como, de fato, falta hoje a pregação da palavra de Deus, é que nos tornamos realmente como Sodoma e Gomorra.

E essas verdades de Deus, mais precisamente sobre a família, precisam ser expostas com clareza e não de modo teórico e abstrato. O Papa Inocêncio XI, sabendo disso, ordenou ao seu Núncio em Portugal, Dom Francisco Nicolini, Arcebispo de Rodes, que avisasse aos pregadores para que não falassem conceitos e floreios, mas apostolicamente, e sobre a moral, mostrando a fealdade e a gravidade dos pecados que a cada dia ofendem Jesus Cristo. Por isso falaremos, aos poucos, como já iniciamos, da família católica em geral, dos deveres dos pais e dos filhos, da educação dos filhos e de como fundar uma família.

A Igreja, em seu magistério supremo, sempre defendeu a dignidade e a santidade do matrimônio, e sempre golpeou sem vacilar qualquer desvio nesse assunto. Por muito pobres que sejam os esposos, vivendo numa aldeia sem importância e numa casa com poucos bens, os pais em uma família são colaboradores da obra de criação, redenção e santificação operada pela Santíssima Trindade na História. Enquanto as demais atividades humanas naturais produzem coisas, a vida comum dos esposos está dirigida a produzir seres humanos. Esses homens, Deus espera que sejam seus filhos adotivos e que vejam Sua essência para que sejam eternamente felizes no Céu.

Um filho é um ser humano, e nenhum ser humano pode existir sem alma. Como só Deus pode criar as almas, isso quer dizer que, a cada vez que um filho é gerado, há uma ação direta de Deus ali, por um efeito diretamente produzido no ventre materno. Em nenhuma outra atividade humana natural há uma cooperação tão grande com Deus. No momento em que ocorre uma fecundação, em nenhuma parte da ordem natural Deus está tão presente por sua atividade quanto ali, porque em nenhum lugar a Sua atividade é tão imediata. O matrimônio é divino no seu princípio, porque é um sacramento, e eterno nas suas conseqüências, porque nele há a geração de seres humanos com almas imortais destinadas a visão sem fim de Deus no Céu, com uma conseqüente felicidade eterna infinita.

E para não tornar esse sermão longo, terei que me contentar em simplesmente apontar muitas considerações sobre a família. Primeiramente, talvez vocês olhem para os padres e monges e tenham pensamentos de que "eles vivem para Deus, são bons, se salvarão, não colaboro de modo notável para a salvação das almas, no mundo somos imperfeitos, até mesmo maus, temos grande chance de nos condenar, etc., etc..". Nada mais falso e anti-cristão. Não é mais santo quem vai para o convento ou seminário, e sim quem mais agrada a Deus. A família é santa na sua origem, que é Deus, e tudo o que sai de Deus é santo. Ele a santificou com sua presença em sua própria família em Nazaré, se determinando a ter sua própria família física, material e no tempo, foi em um casamento, elevou o contrato natural do matrimônio à dignidade de sacramento e aboliu para sempre a autorização de repudiar a esposa e de casar novamente enquanto ela estivesse viva.

Os pais oferecem para Deus as suas penas e dores, levam os filhos ao batismo para que sejam filhos de Deus e os catequizam para que aprendam a viver como filhos de Deus. As obras boas das famílias, feitas por cada membro em estado de graça, fazem com que eles mereçam o Céu por mérito real e em estrita justiça; as tradições que protegem as famílias são santas; todas as virtudes são necessárias para se governar uma família e viver numa família. Imaginar que alguém deve entrar no seminário ou no convento porque é incapaz de governar uma família é um delírio. Alguém que é incapaz de ser pai ou mãe por falta de virtude não é capaz de ser sacerdote ou religiosa. Os esposos devem ter temperança nos prazeres que lhes são permitidos, devem ter fortaleza para lutar pela manutenção da existência da família, nutrindo-a e protegendo-a, os pais e os filhos devem ter prudência e justiça para governar e aceitarem na prática o governo realizado, e para agirem uns com os outros, porque são seres racionais que têm direitos e deveres.

A Igreja abençoa o matrimônio e ensina que quem cumpre seus deveres de casado se conforma à vontade de Deus. Um pai de família se santifica sendo um bom pai de família, e uma mãe de família se santifica sendo uma boa mãe de família. E é necessário dizer que quando a lei de Deus é guardada em uma casa, a vida familiar é um início da felicidade que teremos no Céu.

A sociedade depende das famílias para existir. A família é a unidade básica que permite a existência da sociedade. Ninguém nasce por geração espontânea. Só é possível existir membros na sociedade a partir da união de um homem e de uma mulher. Qualquer outra coisa não é uma família. Todos os membros de uma sociedade surgem numa primeira sociedade, anterior à sociedade civil, chamada família, e isto faz com que a família, sob este aspecto, seja superior ao Estado e anterior a ele por sua própria natureza. Agora, pois bem: se a sociedade depende absolutamente da existência das famílias, e os membros das famílias precisam ter todas as virtudes para que ela exista de modo minimamente humano, é necessário concluir que é somente na família católica que se podem encontrar as soluções dos problemas sociais. Como é possível que a sociedade esteja em ordem, se cada fundamento dela, se cada família, não está?

Queremos justiça e paz social? Então é necessário existir justiça e paz nas relações entre os esposos, e entre os pais e os filhos. Os esposos que tratam com dureza suas esposas, que as obrigam a trabalhos que não são próprios a uma mulher, que as insultam, que impedem suas esposas de cumprir seus deveres religiosos e para com os pais delas, que não deixam elas exercerem a caridade para com os pobres, que as convencem ou obrigam a evitar filhos, que se queixam das esposas diante dos outros e dos filhos, que não manifestam gratidão a elas pelos serviços e trabalhos da casa e o cuidado dos filhos, esses esposos são a raiz das injustiças sociais e da falta de paz na sociedade.

As esposas que insultam os maridos ou os provocam, que querem governar a casa com desprezo dos maridos, que os desobedecem no que mandam de justo, que convencem os maridos a não terem filhos, ou de modo claro, ou porque se queixam caprichosamente do excesso de trabalho que têm, que estão cansadas, que estão doentes, etc..., que negligenciam a administração e o cuidado da casa, causando graves perturbações na família, que se entregam a diversões mundanas com descuido das obrigações de esposa e mãe, que pesam sobre os maridos com insistências, ainda que indiretas, de que falta luxo na casa e que gastam excessivamente, que são frívolas, superficiais, que gostam de chamar a atenção de pessoas de fora da família, que se queixam dos maridos para outros, etc., elas são a raiz das injustiças sociais e da falta de paz na sociedade.

Os filhos que tratam os pais com dureza, os ofendem com palavras e gestos, que os entristecem até o choro, que andam com más companhias, que debocham dos pais, que têm vergonha deles, que os desobedecem, que não estudam e trabalham como devem, que lançam no rosto deles os defeitos que têm, que lhes causam indignação e ira, que dão mau exemplo aos irmãos, que vão em lugares mundanos e ruins e que ofendem a Deus, as filhas que se vestem contra o pudor e os filhos que querem aparecer como sedutores atores de televisão, que buscam convencer a mãe a conceder algo que o pai negou, eles são a raiz das injustiças sociais e da falta de paz na sociedade.

Agora, essas injustiças se espalharam nas famílias a ponto de termos milhões de divórcios por ano, e da formação dos filhos ser simplesmente catastrófica, com a conseqüência de termos sempre novos casamentos mal começados e que manifestam estar doentes já nos primeiros meses, e ao invés de procurarem resolver as causas desses problemas, o que se faz é dizer que os concubinatos devem ser acolhidos e que os esposos adúlteros devem poder receber a Sacrossanta Comunhão? É realmente pedir que desça fogo do Céu sobre nós!... Queremos que haja paz e justiça social? Façamos, das nossas famílias, famílias católicas. O grande remédio do mundo? A família católica.

Em nome do Pai e do Filho + e do Espírito Santo. Amém.


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